Para o cardiologista José Eduardo de Siqueira, que ajudou a criar o curso de Medicina da PUCPR em Londrina, ensinar “é missão de vida”
Conhecimento, técnica, atenção, empatia, cuidado: a extensa lista de características que descrevem bons médicos poderia facilmente traduzir as qualidades de um bom professor. Não à toa, esses dons reunidos num só profissional fazem de muitos médicos grandes professores.
Como o médico José Eduardo de Siqueira, que em outubro comemora não só o Dia dos Professores (15), mas também o Dia do Médico (18).
Cardiologista por 20 anos, Siqueira escolheu a docência como forma de exercer a Medicina fora do consultório e é categórico: ensinar é muito mais que um dom, é uma missão de vida.
“Ser professor está no DNA. É saber que estou sendo útil, pois o conhecimento é essencial para o relacionamento humano”, confessa.
Graduado pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo em 1967, Siqueira tem mestrado em Bioética pela Universidad de Chile e doutorado em Medicina e Ciências da Saúde pela Universidade Estadual de Londrina (UEL) e sua carreira se confunde com o próprio ensino da Medicina em Londrina. Ele foi docente da UEL do início dos anos 1970 até 2009, quando se aposentou, e ajudou a criar o curso de Medicina da PUCPR.
O médico, que dá nome a um prêmio de docência criado pela PUCPR campus Londrina, perdeu as contas de quantos alunos já formou em mais de 40 anos como professor de Medicina. “Um dia eu estava na cantina da PUC quando um aluno me abordou e contou que o avô dele havia sido meu aluno”, conta, rindo.
Ensinando sobre a importância do atendimento humanizado e influenciando diretamente diversas gerações de médicos paranaenses, para Siqueira, o grande desafio da Medicina ainda é formar profissionais que combinem técnica e empatia na medida certa para servir o paciente.
Entre os conselhos que o médico daria aos futuros profissionais, ele cita dois principais: “O primeiro é ter dedicação. Estudar, pesquisar. A Medicina é uma profissão que exige que se debruce sobre o conhecimento.”
“Mas além de garra e força para se atualizar na literatura, o bom médico precisa estar bem preparado do ponto de vista humano”, orienta.
“Eu sempre digo aos alunos: ‘Não foram vocês que escolheram a Medicina, foi a Medicina que escolheu vocês’. E com isso eu quero dizer que a meta do médico é servir o ser humano. Estar ao lado do doente em todos os momentos, respeitando os valores das pessoas”, ensina Siqueira.
Medicina humanista
Essa visão mais humanista da Medicina se revelou ao cardiologista em 1995, quando ele participou de um congresso internacional sobre Bioética, em São Paulo. Após assistir à palestra de um renomado pesquisador do tema, ele decidiu estudar o assunto. Partiu, então, para o mestrado de três anos na Universidad de Chile e, desde então, tem ensinado Bioética, se tornando, ele também, referência no assunto no Brasil.
“Entre 1996, 1997 e 1998 realizei uma formação em Bioética, com uma orientação mais sociológica e filosófica. E após me aposentar da UEL, em 2009, fui convidado pela PUCPR para organizar o curso de Medicina em Londrina, em 2012.”
“Como primeiro coordenador, criei uma grade curricular rica em humanismo, numa linha transversal sobre humanidade. O curso passou a oferecer duas disciplinas obrigatórias em Bioética e uma eletiva, intitulada ‘Bioética e Evolução do Pensamento Humano’”, cita Siqueira.
Segundo ele, o curso de Medicina é “muito técnico, longo e pesado” e vazio no tratamento de questões de humanidade. “Quem se forma na PUCPR tem um diferencial, pois vê o paciente como um ser completo”, afirma o médico, que hoje trabalha na universidade na pós-graduação e mestrado em Bioética.
Além de atuar como cardiologista e professor, Siqueira foi presidente da Associação Médica de Londrina (AML) entre 1990 e 1992. Também foi presidente da Sociedade Brasileira de Bioética entre 2005 e 2007, titular da Academia Paranaense de Medicina, assessor da Redbioética/Unesco para América Latina e Caribe, membro do Comitê Científico da Revista da Redbioética/Unesco e do Consejo Directivo y el Comité Asesor de la Red Latinoamericana de Bioética e membro da diretoria da International Association of Bioethics.
Faculdade de Medicina: quantidade x qualidade
“A realidade é crítica. Temos mais de 350 escolas de Medicina formando profissionais em todos os cantos do Brasil sem controle do grau de qualidade desses médicos. É um paradoxo formar em quantidade mas, também, com qualidade”, avalia Siqueira.
Ele cita a criação de um selo pelo Conselho Federal de Medicina (CFM), que tem avaliado a qualidade do corpo docente das faculdades de Medicina brasileiras e se os cursos têm um arcabouço mais humanista.
Para Siqueira, a questão técnica está bem resolvida no ensino, com o uso da robótica e da inteligência artificial nas aulas, mas a formação humanista ainda deixa a desejar.
“O uso da tecnologia na Medicina é um avanço extraordinário e irreversível para a qualificação das especialidades, mas os cursos ainda precisam de um empenho grande na qualificação humana dos futuros médicos”, diz.
Com o aumento de vagas nos cursos de Medicina, o número de formandos no Brasil tem crescido. Já as vagas para residência médica não têm crescido na mesma proporção. “Vivemos um momento de insegurança, sem saber se os formandos vão dar conta de ter qualificação”, questiona o médico.
Ele acredita que os estudantes de Medicina, apesar de começarem a faculdade “muito jovens e imaturos”, desejam ter uma formação mais ética ao longo do curso. “Uma maneira de praticar isso é contar a história do paciente antes de partir para o estudo de caso, nas aulas”, comenta Siqueira.
Por isso, na opinião dele, os alunos precisam ter acesso a um novo universo de conhecimento, que vai além da técnica. “A Bioética trabalha no campo de valores, o que cada ser humano traz de importante no mundo. E para o médico conseguir acolher o paciente, ele precisa conhecer os valores da pessoa.”
Reconhecido constantemente por seus esforços por uma Medicina mais humana e ética, José Eduardo de Siqueira segue na missão de ensinar a servir. “É muito gratificante ter tido a oportunidade de coordenar um curso de Medicina e montar um currículo que contempla aspectos éticos da ação médica e que está sendo aperfeiçoado pelos meus alunos”, comemora.
Foto em destaque: Reprodução/Youtube
Leia também: Cientistas ligados a vacinas contra covid-19 recebem Nobel 2023 (aml.com.br)
Por Comunicação AML – Divulga e Infinita Escrita
comunica.aml@aml.com.br